Infelizmente, nos dias atuais, apesar de muitos pais reconhecerem a princípio a paternidade de seus filhos, depois de algum tempo ou logo após o reconhecimento da filiação, praticam o abandono afetivo, pouco convivendo com eles, os quais crescem sem a participação ativa dos genitores em suas vidas.
Com o passar dos anos e principalmente depois de alcançada a maioridade civil, os filhos passam a cogitar a possibilidade de excluir de suas certidões de nascimento o nome paterno, em razão da prática do abandono afetivo, como forma de excluir, definitivamente, de suas vidas o genitor que nunca foi capaz de exercer a paternidade responsável.
Com razão, o abandono afetivo, além de ser muito prejudicial ao desenvolvimento psicológico de qualquer criança, acarreta sentimentos de insegurança, de não pertencimento, de humilhação e vexame, fazendo com que os filhos queiram por um ponto final na relação filho-pai, que, na verdade, nunca sequer existiu.
É pacifico o entendimento dos Tribunais quanto à possibilidade de exclusão do sobrenome paterno, em casos envolvendo a prática de abandono afetivo. Entretanto, por vezes, o filho pretende não só a exclusão do sobrenome paterno, mas sim a desconstituição da filiação, como forma de preservar os seus interesses e fazer valer os seus direitos, fundamentados principalmente no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.
Felizmente, há uma brecha na lei, que autoriza a impugnação da paternidade, sem a apresentação de qualquer justificativa, desde que preenchidos os pressupostos legais.
Com efeito, reza o artigo 1614 do Código Civil: “O filho maior não pode ser reconhecido sem o seu consentimento, e o menor pode impugnar o reconhecimento, nos quatro anos que se seguirem à maioridade, ou à emancipação.”
A segunda parte do dispositivo legal dispõe que, depois de atingida a maioridade (que ocorre aos 18 anos de idade), poderá o filho impugnar (contestar) o reconhecimento da paternidade, no prazo de quatro anos, isto é, até os 22 anos de idade completos, sem ter que apresentar qualquer justificativa.
A consequência legal da desconstituição da filiação é a exclusão da paternidade, anulando-se a certidão de nascimento original da parte interessada, para manter no assento civil apenas a filiação materna.
Em outras palavras, não será excluído apenas o sobrenome paterno, como ocorre nos casos em que há prática de abandono afetivo, mas será desconstituída a filiação, de modo a preservar os interesses dos filhos que não tiveram a presença de seus pais em suas vidas.
Contudo, se a parte interessada contar com mais de 22 anos de idade, não será possível pedir a exclusão da paternidade; apenas será possível a exclusão do sobrenome do pai do assento civil e desde que comprovado o abandono afetivo.
Conclui-se, portanto, que o artigo 1614 do Código Civil é de suma importância em casos que envolvem genitores ausentes, descumpridores da paternidade responsável, possibilitando, de uma forma tranquila, a exclusão da paternidade.